Artigo na Revista Coolectiva de 26/03/2019

Nova galeria em Coimbra para irem à arte como quem vai ao pão

Escultura, pintura, fotografia, desenho e arte popular de 44 artistas portugueses para ver e comprar na Vieira Duque, na Baixa.

Desenho erótico de João Cutileiro, arte popular de Júlia Ramalho ou Júlia Côta, escultura em bronze de Margarida Santos, fotografia de Lauren Maganete, pintura de Vitor Costa, entre outros. A Baixa ganhou um novo espaço onde Miguel Vieira Duque diz que quer explorar uma vertente que não é a de galerista mas a de merceeiro de arte. Inaugura dia 30 de Março, às 16h, a Vieira Duque – Galeria de Arte e Cultura, no nº 1 da Adro de Cima, junto à Igreja de São Bartolomeu.

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A ideia é as pessoas ao passarem entrarem facilmente, tal como fazem numa loja de souvenirs ou de artesanato, disse-nos Miguel Vieira Duque, responsável pela gestão artística da nova galeria. Queríamos que o interior tivesse uma certa intimidade mas que não afugentasse, pelo contrário, que convidasse as pessoas, sejam elas quem forem, daí o mote A Urbe e a Génese, continuou. Conservador da Fundação Dionísio Pinheiro, em Águeda, Miguel é natural de Anadia mas vive há 17 anos em Coimbra, onde trabalhou na antiga casa comercial Marthas, na mesma zona da cidade. O curador diz que sente que a Baixa precisa de gostar mais dela própria para ser mais atractiva, sobretudo os comerciantes.

Somos muito conservadores e o que se pensava há 20 ou 30 anos mantém-se, ouço as pessoas a queixarem-se do mesmo e os comerciantes que trabalham na Baixa a dizer que é perigosa e outras coisas. Vieira Duque diz que Itália, onde diz que estudou, é um exemplo, entre outros na Europa, onde em qualquer zona histórica se encontram lojas que vendem arte, onde vamos vendo e conhecendo, mesmo que não queiramos comprar nada. O curador diz que, em Coimbra, o público acha que não tem acesso e há uma ideia muito elitista da arte, por isso gostava de ver a admiração das pessoas ao constatarem que, afinal, também podem ter arte lá em casa.

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peças de 44 artistas portugueses à venda na galeria – do muito naïf ao muito clássico e do óleo às técnicas mais experimentalista -, arte que, não sendo de bolso, é transportável, segundo Vieira Duque. Ou seja, feita pelos autores em diversas dimensões ou com materiais mais económicos e sem moldura, de forma a não terem preços proibitivos e serem fáceis de levar, sobretudo no caso dos turistas. Os preços vão dos 10€ aos 20.000€. 

“Seria bom provar que, tão essencial como comer, é também consumir uma tela. E encontrar na galeria pessoas que explicam a diferença entre as obras, como quem explica a diferença entre um pão de água e um pão da avó na padaria.”

Miguel Vieira Duque

O curador e o proprietário, Paulo Marçalo, também fizeram um esforço por reduzir as despesas do próprio espaço, de forma a não serem obrigados a cobrar comissões demasiado altas aos artistas. Não concordo em absoluto e é um dos maiores problemas para os autores, até porque não se equaciona a produção intelectual.  

Aberta todos dos dias, excepto ao Domingo, a galeria pretende ser um sítio onde podem descobrir arte, comprar ou apenas descobrir artistas e técnicas, sem preconceitosHá arte mais e menos comunicativa, às vezes um autodidacta sobrepõe-se ao académico por causa disso, porque comunica melhor, e aqui há de tudo, disse-nos o curador, orgulhoso das obras tanto quanto da experiência de conviver com todos os autores. A ideia também é, futuramente, albergar apresentações de projectos editoriais e musicais através de parcerias.

 

30 MAR | INAUGURAÇÃO | VIEIRA DUQUE – GALERIA DE ARTE E CULTURA
Adro de Cima, 1 – Coimbra
Site oficial | Facebook
Horário: 2ª – 6ª | 14h – 20h
Sáb | 10h30 – 20h
Contactos: 969754492 | miguel@vieiraduque.pt

 

Fernando Pessoa por Michael Barrett

FERNANDO PESSOA, 1985, por MICHAEL BARRETT (1926-2004); NANQUIM S/ PAPEL, 300×195

“Outra vez te revejo,

  Mas, ai, a mim não me revejo!

  Partiu-se o espelho mágico em que me revia idêntico,

  E em cada fragmento fatídico vejo só um bocado de mim –

  Um bocado de ti e de mim!…”

                                                                            Álvaro de Campos

É sobejamente conhecido o fascínio que Michael Barrett nutria por Fernando Pessoa e pelo complexo heteronimismo pessoano. Ao longo de anos de uma carreira artística, versou em telas

múltiplas individualidades de Fernando Pessoa que hoje redescobrimos a cada passo no encontro da sua obra legada.

Assim, cabe-me acreditar que Barrett não nutria apenas mero fascínio de um qualquer curioso. Antes, mostra um conhecimento profundo da sua obra poética e de artigos que escreveu  que interpretou no seu ritmo, ao seu jeito, pela sua paleta e mestria, em obras que perpetuam o Poeta ímpar e a sua genialidade. Tal como Barrett se via a si próprio: não um marginal, mas um “out side” de modas, estilos pré-definidos, uma personalidade múltipla, mas sua… um compromisso consigo mesmo. 

Um paralelismo místico que Barrett cultivou, levando alguns a pensar num devaneio artístico, mas antes, prova de uma cumplicidade com a obra pessoana e a visão do outro em que, por vezes, se revê.

A Arte é o perscrutar do Artista por caminhos seus ou alheios a si, mas que no percurso intimo se transpõem para composições viscerais que provam a excelência do trabalho e do conhecimento.

Nesta peça encontro, mais uma vez, o intimismo por Barrett de Pessoa!

   

Apresentação do Livro “Lia no país da poesia”, de Leocádia Regalo e Maria Guia Pimpão, Editora Palimage

Nota: Apresentação realizada na Casa dos Açores Norte, Porto, a 06 de Junho de 2015, às 16:00. Com a presença do Dr. José Manuel Rebelo (Presidente da Assembleia Geral da Casa dos Açores do Norte), Dr.ª Mafalda (Colaboradora da Casa dos Açores do Norte), Dr.ª Regina Rocha, responsável pela apresentação do livro na sua vertente poético-literária, Dr. Jorge Fragoso (Editor / Ed. Palimage), Dr.ª Leocádia Regalo (Poetisa e autora), Dr.ª Maria Guia Pimpão (Pintora e autora), e do público que nos brindou com a sua presença e simpatia. A vertente da minha apresentação do livro foi a da pintura da Guia que o ilustra, a cada poema e a capa, magistralmente!

É com muito prazer que faço esta apresentação do livro Lia no País da Poesia, com poesia de Leocádia Regalo e pintura de Maria Guia Pimpão.

Não obstante a grande amizade que me liga a estas duas Mulheres de Cultura, é conhecido o mérito que lhes reconheço nos seus campos artísticos. A Leocádia e a Guia já participaram com a Fundação Dionísio Pinheiro e Alice Cardoso Pinheiro em vários projetos: A Ruralidade na Arte; Exposição Metapoética Pictórica Sob A Égide da Lua; participação de ambas na Estações D’Arte 2014 Outonos Inquietos. Sempre com o entusiasmo e o fervor de quem Ama a Cultura, a Arte e as Pessoas.

Sob a minha secretária de trabalho nessa Fundação, encontra-se uma obra da Guia, E Por Vezes as Noites Duram Meses…, e num dos livreiros encontraremos a obra poética de Leocádia: Passados os Rigores da Invernia; Pela Voz de Calipso; Sob a Égide da Lua; Tons do Sul; Lia no País da Poesia é a conjugação destes dois nomes num diálogo com a poesia, onde a pintura intenta uma sensibilidade crescente, na infância, para as artes.

Começo esta minha apresentação com uma frase do pintor francês Eugène Delacroix, numa carta a Pierret, 1822: “Nunca antes senti emoções tão intensas ao ler coisas tão boas; uma boa página deixa uma bela impressão em mim, que dura por vários dias. Detesto escritores irreais que só têm estilo e pensamento sem uma fonte verdadeira e sensível.”

O diálogo entre texto e imagem foi uma busca constante pautada pela modernidade do Romantismo e grande preocupação para o encontro de concepções da imagem poética, reflexo intertextual entre a poesia e a pintura, atingindo a alma artística da poesia da imagem. Nesta perspectiva da Metapoesia Pictórica, a expressão por excelência está contida no Belo e não necessariamente nas palavras. Aqui o Poeta critica a obra do Pintor e reclama uma leitura própria da obra, também esta, uma outra, recriando a obra de arte na génese e na forma; conteúdos ímpares de palavras omnipresentes que se entrelaçam e se transmutam na Beleza: cor, movimento, sensações, emoções. Inocência? Antes, o abrir das amarras do comum e saltar para o âmago de uma mise-en-scène de trocas entre a Poesia e a Pintura, construindo um diálogo entre a literatura poética e a estética pictórica, fecundando a alma do espectador com a semente do movimento artístico global, sempre transdisciplinar. Os ecos intertextuais entre Poesia e Pintura atingem uma nunca antes conseguida dimensão no poema de Charles Baudelaire (1821-1867) que presta homenagem à obra “ Le Tasse à l’ hôpital des fous” de Eugène Delacroix (1798-1863), representando o poeta do Renascimento italiano Torquato Tasso (1544-1595), autor do poema épico “La Gerusalemme Liberata”.

Neste livro, Maria Guia Pimpão, na sua pintura de magnificência de formas e de movimentos a e para nós, espectadores famintos de cumplicidade e ligeireza de compreensão, traduz nas telas aqui reproduzidas, num traço auto-retratista, uma pintura por sobre névoas da Lua e a claridade da sua alma que vagueia por entre figuras ou metáforas que nos obriga a conquistar, olhando.

Nestas obras, as personagens, reinventadas poeticamente, deslocam-se em doçura e firmeza, com pinceladas ritmadas e leves que contrariam a representação pictórica, num exercício mediúnico que nos dá o universo feminino, artístico, amoroso, transportando-nos de forma cénica duma historicidade presente e latente, para uma cumplicidade da autora que reinterpreta movimentos circulares, moldando sonhos que comprometem o espectador / leitor.

Em Guia, a permeabilidade de realidades sobressaem em telas replectas de Memória, sentimentos e vivências urbanas versus rurais em paralelo, e “causa nostra” da artista que se desvenda numa paleta própria e emergente de vida.

Os olhares lânguidos das personagens escondem humores próprios de quem reclama ser notado. Adormecer em encantos de olhares lânguidos é chamar os sonhos de justos fazedores de uma qualquer realidade transfronteiriça entre o que somos e o que queremos mostrar: É uma pintura auto-emotiva. As sua composições, nesta obra literária com a Leocádia e a sua métrica poética, são trans-vivenciais: Filha, Mãe, Avó, Mulher, Urbana, Rural, Pedagoga.

Acabo com uma frase de Charles Baudelaire, in A Invenção da Modernidade, 1846: “Mas tereis que estar aptos a sentir a beleza; é que, tal como hoje nenhum de vós pode dispensar o poder, também ninguém tem o direito de dispensar a poesia. Podeis viver três dias sem pão; sem poesia, nunca; e aqueles de vós que dizem o contrário estão enganados: não se conhecem.”

 

Catálogo de um Libertino confesso!

Catálogo de um Libertino confesso!

IMG_3467O Libertino – Estética erótica em formas artísticas que preenchem palavras que suscitam prazer.

“Digam o que disserem, ele prova-nos que, malgrado as mais aviltantes experiências que a vida ofereça a um homem [ou mulher], o espírito do amor sobrevive para nos enaltecer as vidas se tivermos a inteligência e a coragem e a fé – e a arte! para persistir.”

William Carlos Williams, in Introdução do Uivo e Outros Poemas


Catálogo para uma exposição colectiva de Arte com estética erótica.

O Libertino, estética erótica em formas artísticas que preenchem palavras que suscitam prazer, exposição colectiva de arte, com curadoria de Vieira Duque, tendo como mote “O Bordel das Musas ou as nove donzelas putas” de Claude Le Petit (Séc. XVII), “Escritos pornográficos” de Boris Vian (Séc. XX), “Uivo e Outros Poemas”, 1956, de Allen Ginsberg, impulsionador da geração beat, e a figura histórica John Wilmot, Segundo Conde de Rochester, que foi um libertino inglês, amigo do rei Carlos II e escritor de muita poesia satírica e obscena, através do filme “O Libertino” de Laurence Dunmore.


“Obscurité charmante, ombre vaste et pompeuse,

Image du neant, voluptueuse nuit,

Mère de mon amour que l’Amour tousjours suit,

Rend-moy l’aymable objet de mon âme amoureuse.”

Claude Le Petit, Songe amoureux. sonnet en vers


Arte!

Onde poderemos enquadrar esta exposição?

Obviamente numa colectiva de arte contemporânea, com pintura, escultura e fotografia, num ambiente intimista e com ilustração sonora da BSO do espectáculo circense ZUMANITY, Cirque du Soleil, e mostra bibliográfica das três obras literárias que serviram de mote e obras de Elizabeth Barrett Browning e de Virginia Woolf – acompanhadas por fotografias do fotógrafo Alexandre Almeida –  numa instalação onde procuro explorar o erotismo metafísico de quem “parte deste mundo” deixando para trás Memórias e Paixões, mulheres que perpetuam sentimentos ímpares de inclusão no ambiente do “tão bem querer” e do possuir pela carne, pelo espírito e pela arte; vidas que se cruzam entre si em momentos e realidades diferentes e com homens que as perpetuaram, num abraço que transcende a morte.

A Arte é isto! Ou antes, permite o perpétuo e o possuir em qualquer momento. É deste enlace que poderá sempre renascer a Alma do Amante! A Alma como ventre do desejo! Taça que saceia o desejo pelo erotismo sagrado que se desprende na “ante-posse” do Belo.

Entre obras do fotógrafo Nuno Horta e do pintor Duarte Vitória, assistimos ao filme filme “O Libertino” de Laurence Dunmore. Ilustração cénica e histórica.

Sem dúvida que se trata de uma exposição nada inocente no tema, mas com uma abordagem eclética e transversal na dinâmica, materializada pela arte, dos sentimentos e das emoções humanas que cabem em cada um de nós no presente e em qualquer passado, apenas reflectindo aspirações, comoções ou anseios, legítimos ou mais ambiguos, que em todos não serão inocentes, mas naturais, com toda a certeza.

Neste catálogo somos convidados a abservar Arte, não devaneios fúteis ou meros “orgasmos expositivos”.

A Vida é o todo e a Arte a sua mais sublime afirmação.

A Possibilidade da Arte. Hoje!

A Possibilidade da Arte. Hoje!

16 de Maio de 2015

 

“Digam o que disserem, ele prova-nos que, malgrado as mais aviltantes experiências que a vida ofereça a um homem [ou mulher], o espírito do amor sobrevive para nos enaltecer as vidas se tivermos a inteligência e a coragem e a fé – e a arte! para persistir.”

William Carlos Williams, in Introdução do Uivo e Outros Poemas

 

A Comemoração do Dia Internacional dos Museus e Noite dos Museus na Fundação Dionísio Pinheiro e Alice Cardoso Pinheiro realiza-se com um conjunto de exposições temporárias a inaugurar e que estarão patentes ao público até ao próximo mês de Julho, terminando o ciclo das mesmas até ao período de férias do Verão; com uma palestra subordinada ao tema escolhido este ano para as comemorações, A Possibilidade da Arte. Hoje!, com Duarte Fiadeiro de Cifantes e Leão, professor, conferencista, investigador académico e aluno de doutoramento de Estudos do Património da Universidade Católica do Porto; com Cristina Bernardini, presidente da Assembleia e departamento de intercâmbio cultural da Atlas Violeta Associação Cultural; e com Vieira Duque, Conservador do Museu da Fundação Dionísio Pinheiro e Alice Cardoso Pinheiro; e acontecimentos musicais como ilustrações sonoras das exposições e ambientes que se pretendem cultivar numa museologia activa, actual, interventiva e transdisciplinar, reflectindo a globalidade de um Mundo a que pertencemos por direito e dever.

Neste âmbito e seguindo a tradição criada pelo ICOM, anualmente a 18 de Maio, este ano resolvemos que a celebração seria no sábado, 16 de Maio, agregando a tradicional Noite dos Museus.

O tema geral para este ano é “Museus para uma Sociedade Sustentável”. A partir deste mote pretendemos trabalhar os novos métodos de pensar e de agir através das várias génese e fruições da Arte, num garante pela diversidade e transculturalidade.

Assim, reflectiremos todos sobre a função do Museu de Arte para uma Sociedade Sustentável: várias perspectivas, múltiplas fruições.

A Cultura e o Lazer são possíveis. Hoje!

Neste panorama, no Espaço Caminhos de Memória, teremos a exposição “A Possibilidade da Arte. Hoje!”, com trabalhos de alunos de Artes Visuais, 12º ano, da E. S. Marques de Castilho, realizados na disciplina de Desenho A, com o tema “Os Sapatos no Surrealismo”; a apresentação da Página Web VIEIRADUQUE.COM sobre Arte, Cultura, Património e Memória; e nos Jardins Quinta de S. Pedro, assistiremos a um espectáculo de dança infantil integrado no projecto sociocultural da Freguesia Águeda e Borralha: Oficina do Adro, da responsabilidade de Cláudia Pereira.

A partir das 16:00, e durante toda a tarde, inauguraremos todas as exposições temporárias selecionadas para este período do ano. Assim:

O Libertino, estética erótica em formas artísticas que preenchem palavras que suscitam prazer, exposição colectiva de arte, exposição colectiva, com curadoria de Vieira Duque, tendo como mote “O Bordel das Musas ou as nove donzelas putas” de Claude Le Petit (Séc. XVII), “Escritos pornográficos” de Boris Vian (Séc. XX), “Uivo e Outros Poemas”, 1956, de Allen Ginsberg, impulsionador da geração beat, e a figura histórica John Wilmot, Segundo Conde de Rochester, que foi um libertino inglês, amigo do rei Carlos II e escritor de muita poesia satírica e obscena, através do filme “O Libertino” de Laurence Dunmore. Com obras de vários artistas da Arte Contemporânea em Portugal, tais como, Mestre José Rodrigues, Margarida Santos, Raquel Rocha, Antonino Neves, Marilyn Marques, Jaír Anjos (aluno de artes da E.S. Marques de Castilho, Águeda), Mestre Cruzeiro Seixas, Michael Barrett, Artur Bual, João Cutileiro, Lima de Freitas, Branislav Mihajlovic, Roberto Chichorro, Matilde Marçal, Moreira Neves, Maria João Franco, Mário Silva, Javier Gil, Quintas, Soares Branco, Jayr Peny, Xico Lucena, José Pádua, René Peña, Cohen Fusé, Aiser Jalil, Lud, DEmo, Duarte Vitória, Nuno Horta.

Expressões Coloridas, exposição de pintura de CARLOS TEIXEIRA, “Existem pessoas que só comem porque lhes levam comida; existem pessoas que só têm agasalhos porque outros se sacrificam por eles; existem pessoas, muitas pessoas, que dependem das centenas de voluntários que todos os dias combatem anonimamente a pobreza. O nosso quotidiano civilizado está cheio desses seres que mantendo uma similar aparência física, se afastaram de tal maneira da humanidade que perderam o laço comum. Cada traço, cada ruga que carregam em sua face, escondem uma história, um pouco de dor, de alegria, decepção, de amor e melancolia (…)”, onde nos é transmitido, numa paleta muito visceral e particularmente forte de cores sobre tela, sob rostos perdidos no meio do nosso quotidiano urbano ou não, estórias de gente esquecida, marginalizada, mal-tratada, vulgar, mas únicas no próprio jogo da vida. Porque o somos. Carlos Teixeira narra vidas contando-as como novelas policromadas, numa (in)decência humana e gritante. Cores que trabalha em pinceladas intensas e robustas em tácnica e certeza, ímpias, mas doces em simultâneo, que nos não permite a indiferença: fruição de vidas alheias, mas tão de quem passa… com participação na última obra exposto de fotografias, Ruralidade, de Jorge Bacelar, Médico Veterinário de profissão mas com enorme paixão pela imagem. Nas suas fotografias revemos o nosso mundo rural relatado por gentes pelo olhar penetrante e invasor de uma lente cúmplice e genuína.

Mulher – Corpo com Alma, exposição de Mosaicos em Pedaços de Azulejos de AIRES FUMEGA, “O artista faz uma tentativa explorar o misterioso interior da mulher. Não será de todo uma tarefa fácil. Os resultados não são garantidos. A procura tem sido constante e o resultado inconclusivo. Esse mesmo desafio é proposto a todos que vêem a exposição. Cada obra exposta pode contar uma história ou retratar um estado de alma. Cabe a cada um entrar nesse espaço imaginário e tentar à sua maneira sair desse labirinto que é o interior de uma mulher. A viagem é feita entre a luz e a sombra. A luz mostra o que a mulher quer que seja visível. A sombra representa um mundo a descobrir. O mistério não será com certeza desmontado, mas cada um sairá com mais do que com que entrou.” Aires Fumega surpreende com uma mestria de um “puzzle” de pedacinhos de azulejos partidos ao acaso, construindo corpos e rostos de uma sensualidade feminina tão reais que a naturalidade nos comove. A singularidade da arte que nos propõe é de uma derradeira fé na imaginação, como génese do Ser, em pedaços mas inteiro, matéria reconstruida e revivida em mulheres que respiram vida e transpiram, em mosaicos, sensações, emoções e seduções!

Selva Tropical – Canto de Pássaros, pintura surrealista do artista RIK LINA, “Sobre o canto de pássaros 1999. Quando nos encontramos sossegadamente sentados numa floresta elaborando desenhos, ouvimos e sentimos os pássaros muito antes de os vermos. Encontram-se escondidos invisivelmente na folhagem, mas se permanecermos quietos num lugar, eles vêm ao nosso encontro, curiosos como sempre e observam-nos. Como tal, admirem as minhas pinturas e verão de igual modo os pássaros. Eu não inventei os pássaros nas minhas pinturas, mas subitamente, eles lá aparecem, poisando entre as pinceladas da folhagem. No momento, assim que se esboçam formas avículas decido dar-lhe ênfase – ou afastá-las com pinceladas da mesmíssima forma que um pássaro poisa na árvore, permanece ou foge. Dada a semelhança entre um pássaro e a folhagem, a distinção torna-se difícil. A camuflagem e ao mimetismo efetivo, cor, forma e movimentos são as mesmas folhagens, dos ramos e das flores. Mas sabemos que eles lá se encontram, ouvimos os seus cantos e seus chilreios. Observamos os seus movimentos irrequietos e seus voos repentinos imitando a vibração das folhas quando o vento sopra através das árvores. A imitação contínua e a constante metamorfose de uma forma para a outra é característica de toda a animação e inanimação dos seres e criaturas da selva. Constituem uma grande esfera… esta fronteira quase ecológica tangível existente em todas as florestas tropicais e bancos de “selvas coraliárias”, com que nos familiarizamos quando nelas nos encontramos mergulhados a desenhar e a pintar. Tento expressar a perceção da dinâmica de trocas entre fenómenos do visível, este contacto especial existente no quotidiano entre o material e o espiritual.” Rik Lina nas suas obras a óleo sobre tela, traz-nos a selva húmida de Saba, como tão bem o definiu Laurens Vancrevel: “ Quando caem as trovoadas tempestuosas sobre Saba, as edificações vegetais afundam-se aqui e ali, mas pouco depois, uma nova composição cresce acima das ruínas como se nunca houvera trovoada. As formas imaginárias e as telas vivas do mato incitaram Lina a combinar o método criativo do automatismo absoluto com estudo de formas e espaços naturais. Ele chamou a esta variante experimental de “automatismo vital”. O automatismo, definido em 1942 por André Breton como a facção específica do pensar, é o método que provoca a condição sublime da unidade com a existência. O automatismo pode ser treinado pelo acto de fazer surgir livremente as associações de palavras, imagens, formas, sons e outros. O aspecto particular do automatismo vital de Lina consiste numa corrente de associações necessárias em fazer agir o automatismo preso a fórmulas pululantes da natureza selvagem.”

As ilustrações sonoras deste dia, funcionando como génese na criação e fruição com o público, Alfa e Ómega, numa Arte de Hoje que se quer aliar a uma Sociedade Sustentável, num contexto moderador entre nós e nós e também o outro que é toda a natureza, serão da responsabilidade de dois projectos tão criativos como esta acção proactiva se deve pautar. O lúdico a par da cultura heterogénea e ecléctica: JAZZWALKERS, um duo de DJ’s, Erotic Beats, “Bla, bla, bla, bla, bla, bla, bla, bla, bla, fumam cigarros, vestem smoking e gravata preta. Yada, yada, yada, Jazz, Blues, Hip-hop, soul, funk, afro- beat, latino, erotic beats. Assim por diante, qualquer que seja, onde quer que, sempre que, tocando principalmente em Aveiro, Coimbra e Lisboa. Etecetera, entre outras coisas. Chega de conversa fiada! Nós tocamos com a alma. Nós tocamos para subconsciente, para o corpo desabitado e com uma dança sem igual. Desde o West Coast, Cool, Swing, Be-Bop, Hard Bop, Delta blues. Ritmos baseados no Hit-hat para levantar o humor. Arranjos de saxofone e trompete para impingir uma alegria involuntária entre o público. Um prelúdio para relaxar a mente. Até dizemos: Basta de emoções, vamos para o contacto físico! Então desencadeamos ritmos mais elevados aumentando o volume das músicas. O subconsciente se transforma numa necessidade dramática de cadência do corpo para manter-se com os ritmos mais vibrantes. Funky-Grooves, Brass-Band, Acid-Jazz, Boogaloo, Afro-Beat, Hip-Hop… tudo para ser misturado a fim de fornecer as necessidades emocionais / físicas do público.” Erótico e sensual será obrigatório! A Arte de ouvir e dançar… corpos e sensações auditivas foi o proposto e ei-los. Propomos, ainda, um café-concerto, no Espaço Cafetaria, com Double Strings, Cátia Pereira no violino e Luís Aguiar na guitarra acústica, bandolim e ukulele. Uma banda constituída por dois elementos que maravilhosamente exploram, a nível instrumental, interpretações de músicas intemporais e clássicas. Uma viagem por Memórias Auditivas, tal colecção que propomos sempre ao público que visita o Museu da Fundação: herança e dádiva, como garante de uma responsabilidade que assumimos no meio museológico global e particular para cada individuo que nos traz a razão deste projecto expositivo em permanência, objectivando a Sociedade e a respectiva Sustentabilidade que é premente e imanente!

Agradecemos a colaboração dos vários artistas e coleccionadores que disponibilizaram as suas obras para este evento, assim como ao José e Nuno Sacramento, à Artfor.Me e à Fundação José Rodrigues. Porque acreditamos que a Arte e a Cultura só em diálogo se pode realizar, esperamos por todos.

PROGRAMA ( com entrada gratuita):

10:00 – Recepção

10:30 – Palestra “A possibilidade da Arte. Hoje!” – Auditorium Clarissimi Viri

Exposição “A Possibilidade da Arte. Hoje!”

13:00 – Intervalo para almoço

15:00 – Espectáculo de dança infantil integrado no projecto sociocultural da Freguesia Águeda e Borralha: Oficina do Adro.

16:00 – Apresentação e inauguração das exposições temporárias:

Expressões Coloridas, pintura, CARLOS TEIXEIRA – Espaço Ágora

com participação de fotografias de Jorge Bacelar

Selva Tropical – Canto de Pássaros, pintura surrealista, RIK LINA – Espaço Projectos Memorium, Jardim de Inverno

Mulher – Corpo com Alma, Mosaicos em Pedaços de Azulejos, AIRES FUMEGA – Espaço Underground

O Libertino, estética erótica em formas artísticas que preenchem palavras que suscitam prazer, exposição colectiva de arte – Espaço Underground

17:00 – Projecção do filme O Libertino de Laurence Dunmore

17:30 – Sunset com JAZZWALKERS – Esplanada Cafeteria Jardins Quinta de S. Pedro

20:00 – Intervalo para jantar

21:30 – Café-concerto Double Strings Cátia Pereira no violino e Luís Aguiar na guitarra acústica, bandolim e ukulele – Cafeteria Jardins Quinta de S. Pedro

23:00 – JAZZWALKERS (Duo de DJ’s), Erotic beats – Esplanada Cafeteria Jardins Quinta de S. Pedro

02:00 – Encerramento

 

de Matos – Memórias d’aquém e d’além

“Todos os meus dias são um adeus.” (Chateaubriand)

Vertigo, 2010
Vertigo, 2010

A Arte tem de comunicar e, nesse acto, o Artista constrói e desconstrói patrimónios tangíveis e intangíveis de Memória, em António de Matos Ferreira (n. 16 de Abril de 1942, Cantanhede) poderão perspectivar, prevendo, os “fantasmas surrealistas” que pululam na sua obra pictórica numa paleta de cores ímpar e representativa de quem vive num pensamento democrático e livre, de vivências e experiências próprias, em momentos presentes, revividos.

Inquietude, 2012
Inquietude, 2012

As suas exposições são sempre “instalações autobiográficas cerebrais” de uma vivência no presente e reflectem o Mundo e a sua visão pessoal, por entre tons gritantes de alguma humanidade desesperante e crítica, se quisermos, em última instância, discorrer sobre a matéria em cada uma das suas telas, sempre encontramos olhares que nos instigam a esse diálogo metapoético pictórico urgente no querermos agentes proactivos ao encontro de paradigmas fulcrais para a acção primeira do trabalho do Artista e no objectivo da Obra de Arte: Inclusão, Permanência e Paixão!

A pintura do De Matos transmite uma inquietude serena, uma nostalgia perto de uma inesgotável tristeza consciente: reiterando sempre instantes resgatados de um Passado: Viagem intensa e policromada!

O sentimento que nos desperta é o da volta da viagem, numa forma sensitiva em que experienciamos esse Passado com flashes de Memórias: Património intangível, irrevogável no Tempo e na Acção. O que comove na Viagem do Tempo que somos e provando que somos um “intervalo na vida do Mundo”. De salientar a Arte presente neste intervalo que reinventaremos nesta exposição de um Artista autodidacta e tímido, de um Homem, de um Viajante, de um Intervalo com Instantes de António de Matos Ferreira.

A sua vida em África e na Europa, aliada a experiências profissionais díspares, levam a sua incursão pela Arte e a sua própria construção estética e estilística, a uma paixão desde cedo, a explorar a comunicação da “paisagem alheia de gentes vulgares” por entre reflexos, neblinas e uma mística quase permanente, por entre palavras surdas de gente com carisma, de rostos disformes que nos assombram e inquietam. Um caminho sempre com movimento e memórias que tocam uma autobiografia transcendente, de sorrisos a medo, tímidos.

O Flautista, 2012
O Flautista, 2012

Desde há alguns anos que a sua tarefa humanizadora por policromias semi-obscuras, através de composições coloridas, enredou por um psiquismo de auto-promoção e de leituras íntimas para com tudo o que o rodeia: permissão de isolamento e de interiorizar o outro e o quotidiano que o não retira, na sua pintura, da intenção de explanar a partir de si a Vida.

Nas novas obras presentes, encontro uma fecundidade latente em pinceladas e manchas de tinta que me transportam a um título de eternas saudades e de um permanente e imanente Adeus que se consolida em composições másculas sensitivas e provas de um percurso transcultural e intercontinentais.

Percursos ou vivências? Com toda a certeza, energias de dádiva que se partilham!

Porque a Vida é o enamoramento de cada um de nós com os Instantes que constroem a nossa Memória, sendo esta o ventre da Alma, como o afirmou Santo Agostinho, permitamos que a Arte povoe o que somos, simplesmente “Um Intervalo”, despertando-nos para os prazeres que rumam à Felicidade, porque já muitos o afirmaram: é tão-só ao que temos direito e ao que devemos aspirar. Façamos jus a essa Felicidade e ao prazer de sermos! Arte!

Com a obra do De Matos sentimos esse prazer pelo próprio António de Matos Ferreira, em pinceladas circulares, mas não concêntricas, sempre a aspirar o permanente, ondulando, por vezes, entre figuras de feminilidade, contrastando com nuances de masculinidade: fecundidade, a Vida que se perpetua, consolidando-se na Arte.


 

Conceição Mendes – Maturidade numa pintura autobiográfica

Afrodite, 2012
Afrodite, 2012

Nas telas de Conceição Mendes antevemos pessoas, em grupo ou solitárias, que se alheiam do Nós para observar obras de arte ou a si próprias, num registo de autoidentidade por entre os tons de azul, vermelho, verde e amarelo. Se pensássemos numa análise psicológica da sua paleta chegaríamos a uma profusão de sentimentos da autora como narração existencialista de si. Em grandes formatos uma autobiografia que comunica a maturidade do exercício de Mulher.


Nota biográfica:

Conceição Mendes nasceu em Nova Lisboa, actual Huambo, Angola.

Mestre em Comunicação Estética, Pós Graduada em Comunicação Estética e Licenciada em Pintura, pela Escola Universitária das Artes de Coimbra – EUAC.

Licenciada em Educação do Ensino Básico, tendo exercido a docência até 2002.

Formação em Decoração de Interiores, pelo Instituto Luso-Brasileiro (Angola).

Docente da cadeira de Pintura na Universidade Livre – ANAI – Coimbra

Participa com frequência em bienais e exposições individuais e colectivas em Portugal e no Estrangeiro, em Museus, Centros de Arte e Galerias.

Participa e colabora regularmente em projectos diversificados no âmbito das Artes Plásticas.

Está representada em diversas Instituições e colecções particulares em Portugal e no estrangeiro.

Prémio de Pintura “MONDEGO 2010” – Museu da Água, Coimbra

Prémio de Pintura “V CERTAMEN DE PINTURA” 2007 – Villafranca de Los Barros, Badajoz, Espanha

Manuel de Pavia

Como quem colhe num pomar tristonho a última laranja sã, colhi a solidão estelar da minha vida.- Voo ou sonho não sei.

Carlos de Oliveira, autorretrato de Manuel Ribeiro de Pavia, in: Vértice, nº 164, Maio 1957

Sem Título (figura feminina),1953
Sem Título (figura feminina),1953

Manuel Ribeiro nasce a 19 de Março de 1907, em Pavia, Mora, adoptando, para si, o nome da sua terra natal (nome na Clandestinidade): de Pavia. Pintor e ilustrador neo-realista, ficou especialmente conhecido pelas suas ilustrações, que marcaram o panorama português das artes gráficas, e que , tão bem, ilustraram as capas da literatura dos seus contemporâneos . Inicia a sua carreira artística em Lisboa, em 1929. Na sua obra vemos muitas vezes presente um Alentejo de tons fortes, mas de extrema pobreza, mulheres e homens trabalhadores, temas campesinos, não deixando de parte o tema da maternidade e da mulher. Devido a contingências económicas, viu-se forçado a uma constante procura de aperfeiçoamentos técnicos gráficos. Os seus desenhos, raramente expostos, eram oferecidos aos seus amigos pessoais. Morreu em Lisboa a 19 de Março de 1957 e em Maio do mesmo ano, a revista Vértice dedica-lhe uma edição especial com depoimentos de vários intelectuais que com ele conviveram.

Exposições Individuais: Exposição Retrospectiva, SNBA, Lisboa, 1958. Exposições Colectivas: I a VII Exposição Geral de Artes Plásticas, SNBA, Lisboa (na II Exposição Geral de Artes Plásticas, a PIDE apreende uma das suas obras), 1946-1953; Modernos Gravadores Portugueses, Galeria Artes e Letras, Lisboa, 1955; Gravura Portuguesa Contemporânea, Galeria Pórtico, Lisboa, 1956.


Noite dentro, uma figura franzina e de sorriso amargo recolhia ao seu quarto numa modesta pensão da Rua Bernardim Ribeiro, em Lisboa e, muitas vezes tendo como jantar apenas um copo de leite, sentava-se ao estirador a encher papéis de sonhos e ilusões. Que desenhava o artista nas folhas que acabavam invariavelmente nas vastas gavetas da cómoda, algumas delas laboriosamente retocadas para ilustrar capas de livros de poetas e prosadores amigos? A dura faina das gentes do mar e do seu Alentejo natal, ceifeiros e ceifeiras orgulhosos e expectantes à sombra de nodosas azinheiras. E mulheres! As mulheres que Manuel Ribeiro de Pavia  nunca teve, mães e companheiras, a esconder fome e sede de amores que a infância sofrida e a vagabundagem pela cidade lhe negaram. Desenhou-as às centenas, a lápis, carvão ou aguarela, sempre sobre papel. Corpos redondos e maciços, lábios carnudos, pés e mãos de gigante, olhos líquidos presos no leitor, a povoar a solidão do quarto e da vida. São neorrealistas, sim, pelo seu momento histórico, mas de um Neorrealismo lírico, sem sombra de pecado, povoando a literatura de uma geração inteira que partilhava com o artista o sonho dos amanhãs que cantam.

Eduardo Teófilo, in  Alentejo não tem sombra, 1954

Stuart Carvalhais, O Artista, O Ilustrador

José Herculano Stuart Torrie de Almeida Carvalhais (Vila Real de Trás-os-Montes, 7/3/1887-Lisboa, Hospital de Santa Maria, 2/3/1961). Cognominado o Bocage da ilustração e um autor ecléctico: fotógrafo, realizador, intérprete, decorador, caricaturista, pintor, figurinista, cenógrafo, ilustrador, publicitário, elaborou também cartazes. Foi um dos mais geniais caricaturistas portugueses. O seu virtuosismo reflecte-se com igual intensidade quer na versatilidade do traço quer na irreverência picante do seu humor. Estagiário no atelier de azulejo de Jorge Colaço, foi pela mão do mestre que chegou ao suplemento humorístico d’ O Século, onde publicou os seus primeiros trabalhos. Seguiram-se outras experiências, nomeadamente: Ilustração Portuguesa, A Voz da Juventude, A Garra, O Zé e A Sátira. Ligou-se aos modernistas e foi co-fundador da Sociedade dos Humoristas Portugueses. Ainda colaborou com A Lanterna e O Pardal, antes de partir para Paris, em 1913, onde alcançou um rápido sucesso. Porém, o apelo pátrio acabará por o fazer regressar, pouco tempo depois, para trabalhar no Século Cómico, para o qual criou a famosa dupla de heróis Quim e Manecas. Dotado de uma criatividade inesgotável ainda conquistou leitores de publicações, como o Papagaio Real, Os Sports, o Diário de Lisboa, Diário de Notícias, Vida Mundial, Sempre Fixe, Ridículos, entre muitas outras. Inicialmente, assinava os trabalhos com o nome “José Stuart Carvalhais”, mas acabou por estilizar-se no “Stuart”. Pelo meio ficaram pseudónimos como “Job” e “Albino”.

Camilo e a sua casa de S. Miguel de Seide, 1958
Camilo e a sua casa de S. Miguel de Seide, 1958

Fiadeiro Duarte de Cifantes e Leão

No desenho está tudo: os contornos certeiros e rápidos definem a figura de Camilo Castelo Branco, recortando-o do vazio do fundo e destacando a sua imagem da casa de S. Miguel de Seide, transmitindo a ideia de “última morada” ou de “penoso refúgio” – ideia reflectida pelo olhar no desenho.

O Ardina
O Ardina

Profundo conhecedor do basfond lisboeta, fixa da capital um registo que cruza com o seu, servindo-o com resultados surpreendentes no uso da mancha (tantas vezes feita com café ou com vinho) e de texturas, na definição ou languidez da linha, nos ritmos do traço. Assim, elegante na ilustração, essencial neste tipo de desenho, cada personagem de Stuart detém, na representação, os conceitos que a ela estão associados. Negra e violenta, a miséria, como o vício ou a solidão, é caracterizada em traços rápidos e rugosos, gastos ou recortados, no contraste de preto e branco.

Na negrura do olhar e no desafio da pose fica clara a afirmação do seu poder, logo negado pelo traço “raspado”, cuja parca incisão de negro, a prometer diluição, sublinha o silêncio, permitindo que se insinue a ironia sobre a solidão.

Uma estética “Romântica” que consegue, de uma forma sublime, transmitir toda a carga emocional de Camilo no seu tempo e temperamento, perspectivando uma época e um tempo da personagem; numa representação cénica crua mas visceral no conteúdo, num exercício do desenho para periódico.