de Matos – Memórias d’aquém e d’além

“Todos os meus dias são um adeus.” (Chateaubriand)

Vertigo, 2010
Vertigo, 2010

A Arte tem de comunicar e, nesse acto, o Artista constrói e desconstrói patrimónios tangíveis e intangíveis de Memória, em António de Matos Ferreira (n. 16 de Abril de 1942, Cantanhede) poderão perspectivar, prevendo, os “fantasmas surrealistas” que pululam na sua obra pictórica numa paleta de cores ímpar e representativa de quem vive num pensamento democrático e livre, de vivências e experiências próprias, em momentos presentes, revividos.

Inquietude, 2012
Inquietude, 2012

As suas exposições são sempre “instalações autobiográficas cerebrais” de uma vivência no presente e reflectem o Mundo e a sua visão pessoal, por entre tons gritantes de alguma humanidade desesperante e crítica, se quisermos, em última instância, discorrer sobre a matéria em cada uma das suas telas, sempre encontramos olhares que nos instigam a esse diálogo metapoético pictórico urgente no querermos agentes proactivos ao encontro de paradigmas fulcrais para a acção primeira do trabalho do Artista e no objectivo da Obra de Arte: Inclusão, Permanência e Paixão!

A pintura do De Matos transmite uma inquietude serena, uma nostalgia perto de uma inesgotável tristeza consciente: reiterando sempre instantes resgatados de um Passado: Viagem intensa e policromada!

O sentimento que nos desperta é o da volta da viagem, numa forma sensitiva em que experienciamos esse Passado com flashes de Memórias: Património intangível, irrevogável no Tempo e na Acção. O que comove na Viagem do Tempo que somos e provando que somos um “intervalo na vida do Mundo”. De salientar a Arte presente neste intervalo que reinventaremos nesta exposição de um Artista autodidacta e tímido, de um Homem, de um Viajante, de um Intervalo com Instantes de António de Matos Ferreira.

A sua vida em África e na Europa, aliada a experiências profissionais díspares, levam a sua incursão pela Arte e a sua própria construção estética e estilística, a uma paixão desde cedo, a explorar a comunicação da “paisagem alheia de gentes vulgares” por entre reflexos, neblinas e uma mística quase permanente, por entre palavras surdas de gente com carisma, de rostos disformes que nos assombram e inquietam. Um caminho sempre com movimento e memórias que tocam uma autobiografia transcendente, de sorrisos a medo, tímidos.

O Flautista, 2012
O Flautista, 2012

Desde há alguns anos que a sua tarefa humanizadora por policromias semi-obscuras, através de composições coloridas, enredou por um psiquismo de auto-promoção e de leituras íntimas para com tudo o que o rodeia: permissão de isolamento e de interiorizar o outro e o quotidiano que o não retira, na sua pintura, da intenção de explanar a partir de si a Vida.

Nas novas obras presentes, encontro uma fecundidade latente em pinceladas e manchas de tinta que me transportam a um título de eternas saudades e de um permanente e imanente Adeus que se consolida em composições másculas sensitivas e provas de um percurso transcultural e intercontinentais.

Percursos ou vivências? Com toda a certeza, energias de dádiva que se partilham!

Porque a Vida é o enamoramento de cada um de nós com os Instantes que constroem a nossa Memória, sendo esta o ventre da Alma, como o afirmou Santo Agostinho, permitamos que a Arte povoe o que somos, simplesmente “Um Intervalo”, despertando-nos para os prazeres que rumam à Felicidade, porque já muitos o afirmaram: é tão-só ao que temos direito e ao que devemos aspirar. Façamos jus a essa Felicidade e ao prazer de sermos! Arte!

Com a obra do De Matos sentimos esse prazer pelo próprio António de Matos Ferreira, em pinceladas circulares, mas não concêntricas, sempre a aspirar o permanente, ondulando, por vezes, entre figuras de feminilidade, contrastando com nuances de masculinidade: fecundidade, a Vida que se perpetua, consolidando-se na Arte.